TRABALHO, DÁDIVA DIVINA
Aristeu, um pequeno produtor rural, tinha uma luta dura no seu torrão.
Iniciava a jornada diária de trabalho bem antes do nascer do sol e ao pôr do sol ainda estava na lida.
Ordenha de vacas . . . limpeza de curral . . . o milho para o moinho . . .
Da sua terra ele tirava alimentos : arroz, feijão, milho, leite, mandioca. De seu pequeno pomar : laranja, limão e outras frutas.
Sobrevivia, apesar das muitas canseiras e desafios.
Eurípedes, um conhecido de Aristeu, há muito tempo vinha azucrinando a sua paciência e colocando dúvidas em sua cabeça.
Dizia que Aristeu deveria imitá-lo; vender o sítio e aplicar o dinheiro em uma caderneta de poupança, em CDB’s e outras coisas das quais Aristeu jamais cogitara e nem sequer sabia existirem.
Falava Eurípedes que o seu dinheiro estava no banco rendendo polpudos dividendos. As suas canseiras no duro trabalho do campo, sem a devida remuneração e reconhecimento da sociedade, se tornaram coisas de um passado renegado
Trabalho duro, é coisa para burro, dizia Eurípedes.
De tanto ouvir aquela lengalenga as convicções de Aristeu ficaram abaladas.
Afinal, estava sozinho no mundo, sem mulher, sem filhos e nada justificava tanta luta por tão pouco. Para quê ? . . .
Naquela segunda-feira, Aristeu estava no Banco do Brasil, para pagar o ITR de suas terras, e alí se encontrou com Eufrásio, um amigo de longa data e seu vizinho, proprietário do “Sítio da Alvorada”. A luta de Eufrásio, a exemplo do que ocorria com Aristeu, também era muito dura. Contudo, ele não esmorecia.
A última conquista de Eufrásio fora a inauguração da sua pequena fábrica de aguardente. A cana que lhe servia de matéria prima ele a colhia do canavial que havia plantado no sítio, assessorado pelo Dr. Venâncio, da EMATER.
Eufrásio fez muita festa ao se encontrar com o amigo Aristeu dizendo-lhe que estava programado para o domingo seguinte um almoço em sua casa, comemorativo do aniversário de seu casamento. Convidou, então, ao amigo, para que comparecesse, participando de sua festa. Seria coisa simples, somente com a presença de familiares e amigos mais chegados.
Aristeu recebeu o convite com alegria prometendo comparecer.
No domingo aprazado lá estava Aristeu junto ao amigo Eufrásio, a família e demais convidados.
Foi uma festa de alegria contagiante. Muitas variedades à mesa farta, preparadas com muito carinho e competência por Efigênia, mulher de Eufrásio, e as filhas Edvalda e Conceição.
Terminando o almoço, Aristeu permaneceu na varanda da casa, animado em um bate papo que se estendeu até a tarde.
O assunto predileto foi a política já que aconteceria nos próximos meses as eleições municipais. Combinaram reunir forças para exigir dos candidatos um compromisso firme visando melhorar as estradas vicinais que por ocasião das últimas chuvas tinham sofrido sérios desgastes, ainda não recuperados.
Ao se despedir, já bem a tardinha; quase noite, Aristeu foi insistentemente convidado por Eufrásio para que antes fosse com ele conhecer as instalações da fábrica de aguardente de que já lha havia falado; a poucos passos da casa.
Aristeu aquiesceu, e lá se foram eles em direção ao galpão da fabriqueta.
Foi aí que Aristeu decidiu abordar Eufrásio sobre uma proposta que lhe fizera para compra de seu sítio feita havia pouco tempo.
Eufrásio confirmou o interesse, ainda mais que agora estava a necessitar de mais terras para o plantío de cana.
De conversa em conversa acabaram por fechar o negócio.
Dias após estavam no cartório, e fizeram a escritura no Escrivão Epaminondas, documento este imediatamente registrado por Eufrásio no Cartório de Registro de Imóveis. Tinha em alta conta o que de certa feita lhe dissera o Tabelião Reginaldo : Só é dono quem registra. Por isso jamais adiava a providência legal asseguratória de seus direitos sobre os imóveis que adquiria.
Com o dinheiro na mão, Aristeu procurou logo um estabelecimento bancário para aplicação do dinheiro que na sua concepção lhe traria rendimentos suficientes para uma vida tranquila e sem as canseiras do trabalho no campo que ele passara a abominar.
Em verdade, a vida de Aristeu sofreu muitas transformações. Passou a morar em um apartamento, no Hotel dos Viajantes. Comprou roupas e sapatos novos. Completou o seu visual com um corte de cabelo moderno no salão uníssex, do Adalberto. Fez desaparecer os cabelos grisalhos, com o Grecin, recomendado pelo farmacêutico Hermenegildo, da “Drogaria Avenida”. Fez as unhas na manicura Marly. O matuto Aristeu se transformou em um dandy. Quem o conhecera antes, dificilmente o reconheceria agora.
E os dias se passaram . . .
Uma notícia na televisão deixou Aristeu perturbado e muito apreensivo.
O governo havia tomado algumas medidas drásticas na área econômica para acabar com a inflação.
Aristeu ficou sabendo que os rendimentos das aplicações financeiras seriam reduzidos a tão somente meio por cento ao mês. Inicialmente, não acreditou. Rendimentos de mais de quarenta por cento ao mês baixarem, como num passo de mágica, para apenas meio por cento ? . . . Não podia ser ! . . .
Acontece, porém, que essa era a realidade.
Nos meses seguintes, entre desesperado e absorto, Aristeu viu as suas economias minguarem obrigando-o a deixar o apartamento do hotel em que passara a morar na doce fase de homem rico. Passou, então, a ter como nova morada um pequeno quartinho na periferia da cidade, em companhia de um amigo com o qual rateava a despesa de aluguel e manutenção.
Mas, as coisas foram piorando de tal sorte que Aristeu decidiu procurar pelo amigo Eufrásio, dono das terras que haviam lhe pertencido.
Hoje, Aristeu, pode ser encontrado novamente no “Sítio da Alegria”. Trabalha como campeiro de Eufrásio.
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