quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Pico da felicidade

DESTINO OU FATALIDADE ?


O dia surge irradiando luz. Tudo é alegria. Contaminado por tal espetáculo Pedro se sente um homem feliz. Feliz somente, não ! . . . Felicíssimo. . . Assustou-se mesmo por se sentir tão predisposto à alegria. Dizem que quando se está assim algo de desagradável está por vir. Ora ! . . . Ora ! . . . Bobagem ! . . .
8h. - Pedro sai para o escritório. Assobia uma sonata, uma valsa ou seria uma tarantela?, confesso que não consigo lembrar-me . . . É feliz, enfim, o nosso boníssimo Pedro. No escritório inicia o trabalho com disposição e entusiasmo. Os mais complexos problemas, tornam-se banais nesse dia maravilhoso.
12h. - Almoço. Tudo corre às mil maravilhas.Sim senhores, que dia ! . . . que dia ! . . .
13h. - Pedro retorna ao escritório. Viaja hoje. Não pode perder tempo. E o bilhete? Qual companhia? Pluma, Real, Cruzeiro do Sul, Aerovias. Real; sim, Real. Ótima companhia. O telefone à mão : - - Alô ! Um bilhete no avião das 17h para São Paulo. Como?. . . Como ? . . . O vôo está lotado? . . . Que maçada ! . . . Pedro precisa fazer a viagem impreterivelmente hoje. (Telefone para outra companhia, homem!. . . ) - Alô. Ahn. . . Como ? . . . Sim. . . Sim. . . Ótimo ! . . . Que sorte ! . . . O Manoel, sabe?, o Manoel, o Manoel do Bazar das Novidades desistira da viagem. Cederia o seu lugar. Que coincidência estar ele na Real justamente agora. Tudo resolvido. Viajará hoje.
15h30 - . . . Onde está aquele contrato que deverá levar ? E a pasta, onde o colocou ?. . . Negócios . . . Negócios . . .
16h40 - O aeroporto está movimentadíssimo. Como viajam de avião!. . . . Aviões partem. Aviões chegam. Que confusão ! . . . Lá está Pedro. Que elegância ! . . . Sujeito feliz . . .
- Passageiros da Real para São Paulo ! Queiram se dirigir ao portão 5. Tomem os seus lugares e boa viagem.
Lá vai Pedro.
Pedro lança um olhar para o horizonte. Chi ! . . . O tempo está ficando brusco. Nada acontecerá meu caro Pedro. O dia hoje é seu. Não tenha receios vãos. Ei-lo a bordo da aeronave. Avião superconfortável. . .Não, Pedro ?... O homem está absorto na leitura de uma revista. Passageiros todos a bordo. Portas hermeticamente fechadas. Tudo rigorosamente revisto. Os motores roncam e o pássaro metálico roda pela pista. Alça vôo. Que decolagem ! Piloto formidável! Não acha, Pedro ? Diabo! . . . O homem não para de ler. Larga esta revista, ó homem !. . . Ahn! . . .
Pedro olha pela janela. Assusta-se com as nuvens ameaçadoras que toldam o céu. Um dia tão feliz ! . . . Não ! . . . Não pensa asneiras, ó Pedro. Não haverá nada. E se houver ? Ora, se houver . . .Não pensemos nisso.
O avião corta o espaço tranquilamente.
17h5 - Eta hora que não passa ! . . . Pedro se impacienta. Tenha calma, homem ! . . .Uff ! . . . Que susto ! . . . Um vácuo, e quê vácuo ! . . . O avião parecia despencar-se. O pior, no entanto, está por acontecer. Veja que temporal se nos avizinha. Pedro, cadê a sua sorte ? Pedro se assusta. Pedro treme. Pedro sua. Pedro murmura : - Não viajo mais de avião. . . É sempre assim. Da última vez foi a mesmíssima coisa. O avião caminha ( ou voa, como queiram) para a zona conflagrada. Trovões. Relâmpagos. O danado salta como um animal bravio. Atinge o ponto crítico do temporal. Ou, o olho do furacão, como se costuma dizer. Que coisa horrível. Os passageiros temerosos murmuram : - Vamos rezar! . . . Não acontecerá nada! . . .Tudo passará ! . . . Reinará a bonança ! . . . Não existe o provérbio ? . . . Ora, deixemos de lado as especulações.
A situação piora. Oh! . . . Que houve ? ! O avião dá como um giro sobre si mesmo. Ouve-se um barulho tremendo. Impacto com algo invisível ! . . . Uma montanha. . . Pico da Felicidade ! . . . Ironia do Destino ! . . . Gritaria infernal ! . . . Pandemônio: - Quebrei a perna ! . . . - Estou morrendo ! . . . - Onde está meu filho ? . . . Onde está Pedro ? . . . Terá morrido ? Não ! . . . Lá está ele. Como ri ! . . . Pedro, que é isso homem ? Não é hora de gargalhar. Você precisa chorar. Pedro, no entanto, explode em gargalhadas sobre gargalhadas. Que balbúrdia ! . . . Fogo, chuva, gritos, mortes. . . Não sofreu nada Pedro ? A sua resposta é uma gargalhada terrível. Pedro não nos ouve. Algazarra medonha. Dura minutos, segundos, horas. Perde-se a noção do tempo ! . . .
. . . Agora, tudo cessa. Já não há mais alarido. Já não se ouve o crepitar do fogo. . . Nem gemidos . . . Nada . . . Parece um cemitério. Parece? . . . E esta coruja a piar lugubremente? . . . Sai daí bicho ! . . . Silêncio completo ! . . . Silêncio tumular ! . . .
Um novo dia nasce.Que belo dia ! . . .Que sol ! . . . Pedro nada disto admira. Não suportou o espetáculo que lhe fora proporcionado pelo Destino. Não foi encontrado tampouco. Saiu a correr desabaladamente. . . Sem destino. . . A gargalhar . . . a gargalhar . . .

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