terça-feira, 26 de julho de 2011

Gonçalves da Costa

MELHORES MOMENTOS


• As areias desta rua guardam cantigas do sol (Harpa Sem Cordas - Zebedeu)
• A estrada sob as amoras, um solo todo de lã (Revisão)
• Gotas de sangue vertido desabrocharão em músicas e chamas (Eles Estão no Futuro)
• A hora convulsa que passa é uma insensata, uma louca . . . (Fuga)
• Os dias caminham lentos / para o ciclo das auroras (Cântico)
• Cai, gota a gota, o leite confortante, sobre a paisagem lírica (Húmus)
• Vazia, se avizinha a madrugada (Procura)
• Ver a estrela dos tenazes. Não lastimar nem sorrir (Esparsas)
• Entre guerras e entre pazes, não ser notado . . . e existir (Esparsas)
• Como a saudade diviniza o que já não existe (Página Íntima)
• Caminhos de músicas, estradas de flores, roteiros resplandecentes . . . (Harpa sem Cordas - Tabor)
• Até logo ventos do meio dia. Deixo-os em paz, agora, porque estou escrevendo de pé, debaixo da ponte, e porque o relógio que tomei com café pela manhã está dando horas no meu estômago (Harpa sem Cordas – Pinceladas quase autobiográficas de um desconhecido)
• Ei-lo andando, andando . . . Todos os anjos do luar lhe vêem entornar paisagens e músicas na mente, ternura chove sobre o seu coração (Harpa – Iluminado)
• A moça da estrada - sonâmbula dos cabelos virgens – caminha de mãos estendidas, e sobre elas pousam aves de luz, egressas da madrugada (Exercício)
• Os ventos selvagens se contêm nos limites da morte, e o momento ficou parado, encolhido nos recessos das rosas (Exercício)
• As mãos têm leveza de séculos e o espaço, perfurado, deixa escorrer nitrogênio misturado com sentimentalismo (Exercício)
• Uma neblina suave, feita de músicas daquele céu, vai borrifando e purificando as nossas almas (Harpa sem Cordas)
• Ao fecharmos os olhos, ouvimos logo um cântico leve, envolvente. É a voz do homem feliz, o que canta sem camisa . . . (Harpa sem Cordas)
• Se quiserem fugir por momentos do mundo real, desçam as cortinas dos olhos, lavem primeiro com sabão de rosas os cinco sentidos . . . (Harpa se Cordas)
• Os passos ficam na poeira dormente da tarde (Tema)
• E a noite me estende as suas fronteiras como uma passagem de cânticos . . . (Tema)
• Me sinto um viajor solitário, perdido na treva, perdido na luz, no alto da montanha, de onde se irradiam todos os destinos . . . (Tema)
• Os ventos loucos conduzem perfumes (Tema)
• Os ventos são temas imperecíveis, em cujas asas se perderam os aedos antigos (Tema)
• A noite arrasta o poeta. O luar, descendo, é o mesmo fluido imponderável que vem vertendo o delírio das almas eleitas , através de séculos (A clareira da Floresta)
• As rosas com certeza foram convidadas para perfumar o ambiente, e também cantarão, pois cada corola é uma boca divina mergulhada em músicas . . . (A clareira da Floresta)
• Os ventos e as nuvens, agora, se acham presos na caverna dos grifos de asa gelada (A clareira da Floresta)
• E o poeta segue. Para trás ficam almas de luz e almas de sombra ( A clareira da Floresta)
• Pássaros, cujo canto é embalo e norte, ressurgiram dos mortos, de improviso, e o vento irmão do luar varreu a morte, - poeira do transitório paraíso ( Soneto)
• Vão andarilhos buscando itinerários divinos, não sabem onde nem quando a aurora envolve os destinos . . . ( Cântico )
• A hora é o imortal continente sem relógios, sem fronteira (Cântico)
• A tempestade, distribuindo sustos, uma noite do século me aviva. (Depósito)
• O crime também é uma arte, conduz a celebridade . . . Miguel Ângelo, Homero, Dante, assim como Nero, Judas, Satã, foram artistas, embora trilhando caminhos diversos (Exercício n.º 2)
• Tristezas escorrem pelo chão, vão misturar-se com as ervas pisadas, porque rastros nervosos procuram a bela sonâmbula, por céus e terras a procuram (Exercício)
• Sigamos, contritos mais intrépidos. Deixemos para trás as pirâmides do desalente, as planícies do cotidiano, os vales do talvez . . . (Exercício)
• Os cavalheiros do Santo Graal, os guerreiros de Salladino, passavam cintilando nas planícies eternas, rápidos, perseguindo relâmpagos (Harpa sem Cordas)
• Partir, partir. Mas para que partir ? (Tríduo)
• O passado sempre volta, no seu vestido de espelhos (Reflexo)
• Transpõe alamedas calmas, à luz mortiça da estrela (Reflexo)
• Rosais de embevecimento tornavam a área infinita (Reflexo)
• Sempre a música distante a insinuar devaneios . . . (Canção Leve)
• A morte, embora faminta, sempre tem olhos escassos (Canção Leve)
• Ninfas vestidas de arco – íris cantam nos bosques alheios (Canção Leve)
• Arderei em mil fogueiras, serei vale, asfalto, rosa (Cântico)
• Desço os degraus do mistério, sobem outras luzes, já . . . (Cântico)
• Festa de luzes e tintas, cala vento ermo, não fales (Viagem)
• Sombras ariscas, famintas, buscam comida nos vales (Viagem)
• Corsários de fogo assaltam a sensibilidade, e se transformam em hinos, que se estrelam como barcos pelo grande oceano (Aparas)
• Quando a alma voeja entre pétalas de solidão, em recinto santificante, suas asas tocam as da Poesia , e do contato mágico emergem mundos, panoramas, novas asas, aparecem figuras de acalanto com as mãos estendidas para enxugarem lágrimas . . . (Aparas)
• Trapos de nuvens corriam pelo azul, como receosas de serem tragados pela luz ! ( O Peregrino)
• Desenrolando o seu painel de sombras, a noite vinha caindo, magoada e silenciosa ( O Peregrino)
• Há, entre montanhas, um lugar feito de dias e de noites, chamado Sítio de Fênix. Nos seus jardins as flores da vida sobrepujam as flores da morte. (Volta do Imparcial)
• O Sítio de Fênix não tem comunicações com o mundo exterior. Solitário, faz lembrar aquele subterrâneo que, segundo Vítor Hugo, Caim fez construir, em vão, na tentativa de fugir ao olho da Divina Providência (Volta do Imparcial)
• O salto conduz à estrela. Na luz a glória cintila ( Bailarina)
• A luz, que delira e inocula delírios, sublima-se, adquire força, condensa-se em céu (Aparas)
• . . . punhais do teu corpo feriram o lago triste. . . (Canção)
• A noite te envolve a fronte, noite – loucura estrelada, e nos teus braços em chamas colherei a madrugada (Canção)

Gonçalves da Costa

Comentário

Duas obras de Gonçalves da Costa encerram esta retrospectiva. Outros trabalhos do poeta, publicados em jornais de Minas Gerais e de outros estados, certamente existem. A maioria desses jornais - talvez a totalidade - não mais circulam e, na ótica do colunista, não foram os seus arquivos preservados. Para os leitores que gostam de poesia e admiram a obra de Gonçalves da Costa, apresentamos “Tríduo” e “Viagem”.

José Geraldo Leal
Rua Rufino da Rocha - 64
35350 000 - Raul Soares (MG)


Tríduo

O desespero tem as suas flores . . .
No chão propício germinou, cresceu.
É o delírio de vozes, luzes, cores,
disfarce para os ídolos de breu.


Estorcem-se, contorcem-se, nas ânsias,
os loucos embebidos do elixir . . .
Outras distâncias. Para que distâncias ?
Partir, partir. Mas para que partir ?


Agora, um mágico, no mundo externo,
Transforma numa rosa cada inferno,
Cai-lhe das mãos a glória, tudo é céu . . .


Mas a invisível roda esmaga, esmaga.
Amanhã, um crepúsculo, uma chaga,
células mortas se arrastando ao leu.

- x -

Viagem

No pensamento em vigília
o anjo, coroado de vozes,
se levanta, a estrela brilha
sobre os abismos ferozes.


Leve harmonia, floresce
- vegetação sobre o altar
as palavras são a messe
nas planícies do Cantar.


Festa de luzes e tintas.
Cala vento ermo, não fales,
Sombras ariscas, famintas,
Buscam comida nos vales.

Agora, a paz sobre os ombros,
traz a Escada de Jacó . . .
Irei além dos escombros,
Sobre as vertentes do Só . . .

Gonçalves da Costa

Comentário


Itamar Lopes, eficiente servidor da agência dos correios de Raul Soares, dando prosseguimento ao brilhante trabalho do pai na referida repartição - o nosso saudoso amigo Itagiba Lopes -, é também um admirador de Gonçalves da Costa e de sua obra. Privou da amizade do poeta. Em um setembro dos anos 80 o poeta presenteou Itamar com o trabalho por ele intitulado “Tristes” , um conjunto de trovas. É um trabalho inédito do poeta que graças à gentileza de Itamar lançamos nesta coletânea.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha - 64
35350 000 - Raul Soares (MG)


TRISTES


Ninguém engole uma argola,
também não há quem engula
um paletó com a gola,
por maior que seja a gula.

#

Lugar bem lindo, tão alto,
mas nem rosa nem jasmim . . .
Eu quis fugir dei um salto,
e caí dentro de mim.

#

O assassino ao ser ouvido,
diz com o respeito devido,
que a sua arma era de espuma,
ou não tinha arma nenhuma . . .

#

Nem idiomas nem dialetos
convencionais . . . Não convinha
o traficante de insetos
aos proprietários da vinha.

#

Se manténs muitas mulheres,
e vês muitas pelas ruas
na área dos malmequeres,
algumas delas são tuas.

#

Por mais que a gente se insule,
sempre fala, sempre diz,
ás vezes até de um bule
goteja a frase feliz . . .

#

Tenho dois laboratórios
na rua dos Alcaçuzes,
num deles fabrico sombras,
e no outro fabrico luzes.

#

As ruas pretas e brancas
passam junto ao meu nariz,
sempre que ocorre um desastre
eu escapo por um triz

#

Andas dizendo que eu disse,
mas não afirmo que disse,
pois vivo aguando os canteiros
da minha eterna doidice.

#

Sou hoje de poucas falas,
acho que tudo é tolice,
e que apenas vale a pena
olhar os olhos de Alice.

=

Gonçalves da Costa

Comentário

A década de 50 do século passado foi aparentemente a mais produtiva do poeta. “ BAILARINA” foi um dos sonetos publicados.
Inspiração, imaginação e fantasia na sua elaboração.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha - 64
35350 000-Raul Soares (MG)


BAILARINA


O salto conduz à estrela,
na luz a glória cintila.
Loucura santa ! Contê-la
é a faina da hora tranqüila.

Vitória - régia em volteios,
ninfas de selvas e empíreo,
céu de clarões e gorjeios,
Lírio nos espaços, lírio . . .

A arte divina, parece,
é amargurada procura.
Embalde, A luz esmorece,
dissolve-se a noite escura . . .

Gritos e gritos na arena.
Duelos do Não e do Sim . . .
Voar ! A amplidão é serena,
sobre as nuvens do Sem – Fim !


A década de 50 do século passado foi aparentemente a mais produtiva do poeta. “ BAILARINA” foi um dos sonetos publicados. Inspiração, imaginação e fantasia na sua elaboração.


BAILARINA


O salto conduz à estrela,
na luz a glória cintila.
Loucura santa ! Contê-la
é a faina da hora tranqüila.

Vitória - régia em volteios,
ninfas de selvas e empíreo,
céu de clarões e gorjeios,
Lírio nos espaços, lírio . . .

A arte divina, parece,
é amargurada procura.
Embalde, A luz esmorece,
dissolve-se a noite escura . . .

Gritos e gritos na arena.
Duelos do Não e do Sim . . .
Voar ! A amplidão é serena,
sobre as nuvens do Sem – Fim !

Gonçalves da Costa

Comentário


O poema CANÇÃO foi publicado há mais de cinquenta anos em edição comemorativa do décimo nono aniversário do Jornal do Povo de Ponte Nova. Nota-se na obra uma forte influência dos movimentos literários pós - romantismo.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha - 64
35350-000 -Raul Soares (MG)


CANÇÃO

Voaram punhais do teu corpo
furaram o lago triste
vieram os peixes à tona
para o cântico da lua . . .
Lâminas virgens, divinas,
água e sangue ao recebê-las
se tornam em harmonias,
logo se tornam estrelas.

Teu corpo, flor pequenina
das paisagens do mistério,
ínfima m chispa, incendeia
a cabeleira das noite.
E o réprobo, o expatriado,
que se arrasta num gemido,
sente, entre sombras difusas,
a estrela do lar perdido.

Essa esperança que afaga
espera o afago sem nome
que há de surgir como surgem
os pensamentos dos anjos,
e os delírios amorosos
Aos lírios dos vales fundos,
Aos lírios, em cujo seio
Sorriem todos os mundos.

Sinto lanças pela carne,
teu corpo é incêndio de lanças,
os meus olhos profanaram
a auréola ardente de santa . . .
A noite te envolve a fronte,
noite - loucura estrelada,
e nos teus braços em chamas
colherei a madrugada.

Gonçalves da Costa

Comentário

No ano de 1957, na tranqüilidade de Raul Soares, Gonçalves da Costa escreveu e publicou “SONETO” e “ESCUTA”, que lançamos hoje nesta coluna de nostalgia e que resgata a memória de um dos maiores poetas mineiros do século passado.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha -64
35350 - 000 - Raul Soares (MG)

0 0 0

SONETO

Serei a morte farejando a vida
na primavera azul das tuas formas,
a visão será pétala caída
nesse mapa telúrico, sem normas . . .

Contemplativa, ambiente, silenciosa,
a mensageira do esplendor mortiço,
do seu altar, virá despir-se a rosa
em santidade, em madrugada, em viço . . .

Vultos de mármore, aluviões de renda !
De joelhos ! . . . No crepúsculo, a oferenda
é humanidade que se diviniza . . .

Serei presença em teu mistério, amada,
visão entre céus, lívidos, coroada
de eternidade, som, lampejo, brisa . . .

#

ESCUTA

Escuta, ó Canção – Ternura.
Amanhã seremos crianças,
colheremos, na verdura,
borboletas e esperanças.

Serão asas os meus braços,
duas asas te darei . . .
Serão nossos os espaços,
a estrela, a barba do rei . . .

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Gonçalves da Costa

Comentário

Em mais um “Cântico” do culto poeta, cuja obra procuramos resgatar nesta despretensiosa coluna, encontramos a sua induvidosa vinculação à Escola Mística. “Violante”, a “ virgem Violante”, referida nos seus versos, foi a sóror Violante do Céu, poetisa portuguesa que nasceu em Lisboa. Cognominada pelos seus contemporâneos a décima musa portuguesa. Da sua obra, toda mística, fazem parte : Rytmos, Parnaso Lusitano de Divinos e Humanos Versos. Escreveu em português e espanhol.
Em “Canção Leve” muito lirismo e belas imagens.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha - 64
35350 000 - Raul Soares (MG)


Cântico

A idéia veio, radiante.
O encanto raiou, após . . .
Violante, a virgem Violante
Paira bem junto de nós.

Arderei em mil fogueiras,
Serei vale, asfalto, rosa,
soarão vozes carpideiras
sobre a manhã dolorosa.

Ouço, na incerta procura:
“O anjo mau tornou-se bom . . .
E arrasto a chaga sem cura
pelas escarpas do som.

Vão andarilhos buscando
itinerários divinos,
não sabem onde nem quando
a aurora envolve os destinos . . .

Desço os degraus do mistério.
Sobem outras luzes, já . . .
Violante é um país etéreo
que em meu ser florescerá.

- x –
CANÇÃO LEVE

Sempre a música distante
a insinuar devaneios . . .
Ninfas vestidas de arco – íris
cantam nos bosques alheios.

Talvez o cântico leve
em carruagem se transforme
para levar-me às paragens
onde o Espírito não dorme . . .

A morte, embora faminta,
Sempre tem olhos escassos,
Flui nos cânticos de vida
que assoberbam os espaços.

Rosa, ó flor de hinos intactos,
Os próprios ventos governas . . .
Que sobre mim te desfaças
em harmonias eternas.