segunda-feira, 25 de julho de 2011

Gonçalves da Costa

Comentário

Soneto” e “Depósito”: dois sonetos bem ao estilo de Gonçalves da Costa, um dos grandes poetas mineiros do último milênio. Temas fortes e chocantes em linguagem simples e impregnada de lirismo levando o leitor a momentos de intensa emoção.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha - 64
35350 000 - Raul Soares (MG)


SONETO


Os cães do tempo laceraram vestes e carnes . . .
Vai seguindo o mutilado . . .
No devaneio, expõe rasgões celestes,
por onde escorre o sangue iluminado.

Pássaros, cujo canto é embalo e norte,
ressurgiram dos mortos, de improviso,
e o vento irmão do luar varreu a morte,
- poeira do transitório paraíso.

Há a virgindade dos primeiros luares,
o hino do início que ficou nos ares,
vastos rosais de bem-aventurança . . .

O mutilado . . . Grande como um culto,
visível nos espaços, o seu vulto
é rodeado de estrelas, uma lança . . .

- x -

DEPÓSITO

A tempestade, distribuindo sustos,
uma noite do século me aviva,
Gritos, mortos, raízes, vãos arbustos,
ó generalizada sensitiva . . .

Relâmpagos nas mãos desnorteadas . . .
Mãe onde estão os frutos do teu ventre ?
Água e terra, lufadas e lufadas
Entre ermos vultos, entre angústias, entre . . .


Aturdimentos. Orações partidas.
Vidas gemendo o amparo de outras vidas,
a salvação, o estio, a estrela, a calma . . .

Aparição de horror transpondo muros,
Atravessando sóis e céus escuros. . .
Ó crucificação no outeiro d’alma !

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