sábado, 23 de julho de 2011

Gonçalves da Costa

Comentário

Com muita satisfação apresentamos para deleite dos cultos leitores mais uma bela página do grande Gonçalves da Costa.

José Geraldo Leal
Rua Rufino Rocha - 64
35350 - 000 - Raul Soares (MG)

EXERCÍCIO

Amoça da estrada - sonâmbula dos cabelos virgens - caminha de mãos
estendidas, e sobre elas pousam aves de luz, egressas da madrugada. Os
ventos selvagens se contêm nos limites da morte, e o momento ficou parado, encolhido nos recessos das rosas. As mãos têm leveza de séculos e o espaço, perfurado, deixa escorrer nitrogênio misturado com sentimentalismo. A imaginação se enrola num capuz de linho, porque são vedados exercícios de vôo, enquanto mensageiros conversam com as águas, em pensamento, para que não façam barulho nas pedras. Quem trouxe o dia para surpresa da sonâmbula ? Quem a transformou em mistério e a fez volátil, sorriso e miragem, decepcionando os peregrinos ? Tristezas escorrem pelo chão, vão misturar-se com as ervas pisadas, porque rastros nervosos procuram a bela sonâmbula, por céus e terras a procuram.
Busquêmo-la, sim, ó peregrinos, guiemo-nos pelas estradas mortas, soltemos no espaço a nossa matilha de interrogações ofegantes ! As flores e os frutos sorriem de nós porque certamente a estão vendo, ela continua de mãos estendidas, procurando os caminhos que conduzem ao coração . . . Sigamos, contritos mas intrépidos, deixemos para trás as pirâmides do desalento, as planícies do cotidiano, os vales do talvez . . . Os perfumes iluminados dela, a moça da estrada, a sonâmbula, nos levarão ao coração que ela procura, ao fundo do coração, ó peregrinos deliciosamente loucos ! . . .

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